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9.27.2010

As cascas de banana do poliamor

Falemos do que não vem nos livros de História, nem nos tratados de Antropologia ou Sociologia.

Tive um fim de semana doce e surpreendente, porque sim, conheci alguém e basicamente entrámos em reclusão voluntária, confidencias erráticas e compulsivas, além do habitual esquecimento do que sejam horários, fome ou sono.

No meio de toda esta verborreia falámos de tudo o que não vem nos livros de História. Por exemplo, contei-lhe que que eu me lembro do 25 de Abril são murais pintados, são soldados barbudos a gingar por Lisboa em fardas muito amarrotadas, e uma despensa a abarrotar de conservas (pelos vistos muita gente resolveu açambarcar o supermercado). Ela contou-me que o que se lembra dos dias após a queda do muro de Berlim são cascas de banana. Sim, cascas de banana. Pelos vistos havia uma procura enorme por bananas por pessoas que vinham de todos os Ostländer de comboio a Berlim de propósito comprar bananas (E tampões também, pelos vistos). E que os comerciantes obviamente exploraram isso, e que a situação atingiu extremos de haver contentores de lixo a abarrotar só de cascas de banana.

No meio disto pus me a pensar quais é que são as cascas de banana ou os soldados barbudos do poliamor. O poliamor tem sido estudado, documentado, filmado, gozado, assumido, denegrido, mas sempre documentado ou descrito. Há 7 anos, eu ainda tinha que explicar o que era o poliamor na maior parte das vezes. Hoje em dia, não sei se por via do activismo, ou se por via da cidade especial em que vivo e das "cenas" em que me movo, não conheço ninguém que não saiba o que é o poliamor. Tenho nostalgia do tempo em que não havia um hype poly, e em que poly ainda não significava "vou fazer o que me apetece e os outros que se fecundem".

De modo que a minha pergunta, para mim própria e a vocês, é, quais é que são para vocês as cascas de banana do poliamor?

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3.15.2010

Sussurros..


Se as palavrinhas mágicas nunca antes tiverem sido ditas, é provável que um "amo-te" dito por alguém durante o sono ou mesmo na semi-inconsciência do adormecer nos faça perguntar "será que é para mim?", enquanto nos aconchegamos ainda mais, com cautela para a não despertar, ao belo ser balbuciante.

...não me parece que seja dramático. Quer porque geralmente tais incertezas se esclarecem mais tarde ou mais cedo, se o quisermos, ou porque geralmente a própria natureza anti-categorias e prateleiras da não monogamia escolhida torna geralmente tais incertezas menos peremptórias na sua necessidade de esclarecimento imediato.

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12.06.2009

"o que fiz no passado fim de semana"

Em grande falta de imaginação..

Mas talvez possa ser interessante. Este fim de semana resolvi dar uma festa de inauguração do meu apartamento e e convidei não só amigos próximos, mas também pessoas que têm tido um significado, nem sempre positivo, nas minhas constelações e telenovelas poly.

tive a sensação de perdoar o meu próprio passado (nas coisas que não correram tão bem, ou decisões foram tomadas das quais não me orgulho) de ter na minha sala a minha ex namorada, que também é a corrente namorada da minha outra ex namorada-que-não-posso-ver-nem-pintada-à-frente, com a sua nova namorada, com a qual me entendi muito bem, e provavelmente me vou entender um dia destes ainda melhor. Estava também uma ex-namorada da tal minha outra ex namorada-que-não-posso-ver-nem-pintada-à-frente, que também é namorada de um play-buddy meu. Gostei também de ver o meu namorado em grande aconchego-sexy com varias das pessoas da festa, e a naturalidade como tudo aconteceu. Estavam também duas grandes amigas minhas, das quais uma é uma play buddy de longa data, e que proporcionaram uma grande alegria ao me convidarem para o seu casamento, e gostei de ver como conheceram pessoas novas na minha festa que vão sem duvida acrescentar à sua to-do list.

Sim, toda a gente que estava na festa, reparo agora, vive ou já viveu poly durante vários anos.

Acabei na minha cama sem historias novas, mas com a sensação que tenho bons amigos à minha volta e que as coisas por vezes correm mesmo bem, e não tem mesmo que correr de outra maneira.

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11.26.2009

Mais compersion, amor ressonante, tesao ressonante

É sempre bom, e sempre bom sentir que ainda temos over and over a capacidade de sentir a tal compersion, a tal alegria ressonante, ou alegria por ressonância, ficarmos felizes por o nosso amor, ou um dos nossos amores estar nos braços de um dos seus amores (E quem diz braços, diz outros membros, ou algemas, ou lençóis, ou....)...

Mas o que me passou agora na cabeça, é que o estado talvez ainda mais desejável que essa alegria excitada é aquele em que já não se nota diferença, em que simplesmente se passa, sem pensar no assunto, uma noite como outra qualquer. Porque não é preciso pensar no assunto.

Numa nota pessoal: Estou muito feliz por voltar a sentir compersion, ou amor ressonante, porque durante uma relação recente de contornos apenas marginalmente poly senti muitos ciúmes e comecei a perguntar-me se tinha a ver comigo ou se era especifico à situação. E a resposta é, a compersion está cá, como sempre esteve. Hurra!

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7.22.2008

Size matters: o tamanho da cama!



...Ir "a três" a n+1 lojas de colchoes.

...Pedir para ver os maiores colchoes e estrados que a loja tem.

...Testa-los indeed a três, em várias combinações, este no meio, aquela de lado, este a fingir que está a ler e com comichão na barriga, a que está no meio a simular uma ida á casa de banho nocturna, para ver se o colchão estremece muito ou pouco... Descobrir que a dureza dos colchoes é função do maior ou menor peso que está em cima. Não é nada linear.

....Gozar o prato da reacção das pessoas e dos lojistas. Opcionalmente, fazer um kiss in.

... Opcionalmente generalizar o kiss in ao resto dos clientes da loja.

... E no fim ir para casa genuína e sinceramente triste porque a solução não é mesmo nada fácil.

...Um colchão de casal é pouco, mesmo para pessoas com corpos elegantes, dois colchoes de corpo e meio juntos é demais, alem de ter aquela fenda irritante no meio. e nem todos temos casas com metros quadrados para dar e vender... e depois falta o estrado e a roupa de cama...

..nem pensar numa cama de àgua.

Conhecem a situação? O que fazer? mudar de cama, de apartamento, ou mudar de volta para a monogamia? ou mesmo para o celibato?

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11.27.2007

Paciência


Novembro é isso mesmo, mês de ver chover, de ficar em casa, a bebericar chá e a ouvir música particularmente embaraçosa, sentir a falta dos que foram, sentir saudades de amores antigos ou remoer porque o amor presente não é como queremos, ou porque não conseguimos dar o que querem de nós.. Ou ainda, porque damos tanto que alguém acabe por se sentir mal por esse excesso.

Nem sempre as coisas são fáceis, nem sempre por se rejeitar paradigmas problemáticos implica necessariamente que todo o novo terreno por desbravar vai ser fácil. Precisamente por ser novo e tão belo… torna se por vezes difícil.

Onde ir buscar apoio e conselho para problemas pouco frequentes? Como comunicar problemas e sentimentos novos? Como resolver conflitos dentro de relações que têm poucos exemplos de onde copiar comportamentos e ir pedir conselhos? Onde parar de discutir conflitos e viver um pouco? Onde viver menos um pouco para resolver conflitos pendentes?

Hoje só peço: paciência. Para mim e para elas.

(Obrigada a todxs que me apoiaram, presencialmente ou não, e que acham piada á historia e que querem que ela funcione)

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9.04.2007

Quotideano delirante parte IV? quem nos pega





(nota, a numeração desta serie - quotidiano delirante - não é propriamente lógica)

Quando estamos em baixo ninguém nos pega. Falhanço colectivo. Ou seja, quando mais precisas de companhia, nem sequer os agenda-free crónicos têm tempo para irem beber uma cerveja e aturarem te a dor de corno (quanto mais quererem alguma coisa mais). Até a tia beata te dá tampa se quiseres ir beber chá com ela.

Outros dias demoramos duas horas a fazer os 10 metros entre a pista de dança e o bengaleiro porque somos abordadas por várias que nos querem conhecer. Vai-se la perceber isto..

Outros dias estamos cheias de timidez, não se diz nada de jeito, sentamo-nos à mesa de um bar com as nossas amigas e companheiras de conspiração poliamorosas e não abrimos a boca, e elas parecem não estar interessadas no que tens para dizer... Noutro dia desbravamos abissais distâncias sociais com pessoas que nunca vimos antes e que nos cativaram com um sorriso e uma promessa perfeitamente insignificante.

Outras vezes ainda passamos meses a tentar acabar com a solidão, com esquemas e estratégias, planos e telefonemas, tampas e mais tampas, tomamos iniciativas e levamos mais tampas ainda. E depois.. um dia, do nada, alguém pega num copo de cerveja como se fosse um ceptro, atravessa a pista de dança só para dizer olá e dizer-nos que não quer deixar-nos ir embora sem nos conhecer.


Miséria tão humana, todo este tentar e falhar...
Alegria tão humana, este renascer da esperança ..

....para a menina (V.S.) do ceptro-cerveja.

para outras meninas haverá outras dedicatórias.


(eu devia estar a escrever sobre o Campo Galdério para Gajas Poliamorosas na Turíngia, mas não me apetece)

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8.23.2007

Quotideano delirante V



Quotidiano delirante poliamoroso é....

.... Começar a contar uma historia á tua namorada e ela dizer que o teu namorado já lhe contou, quando foram emborcar cerveja juntos há já bué da tempo...
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"Fogo, já te disse que já ouvi essa história! já te disse que o (insert name here) já me contou, ou já te esqueceste que a gente vai volta e meia beber cerveja juntos?"

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5.17.2007

Quotideano delirante VII: vais sair com a tua namorada?


"vais sair com a tua namorada nesse estado???"


... diz para ela, que tambem é sua namorada...



"vais sair nesse estado com a tua namorada? e que tal passares um pente nesses cabelos, e lava os dentes antes de sair? por muito atrasada que estejas acho que ela merece que te arranjes um bocado... Mudaste os lencois á cama? E nao se ponham a beber outra vez, que andas com umas olheiras até aos pés, e nao se deitem tarde que amanha tens de te levantar cedo!!!


Dito, isto, divirtam-se, dá lhe um beijo da minha parte, e cuidem se!"

5.16.2007

Quotideano delirante VI: cozinhar





Quando cozinho ou vou ás compras, penso sempre em termos de 3 pessoas :-)
o três é definitivamente um número muito importante.

1.27.2007

Quotideano delirante III - O rol da roupa como assinatura personalisada


Este ano estive deslocada noutra cidade em trabalho. E como qualquer pessoa deslocada em trabalho, trabalhava que nem uma desalmada, tendo de confiar a lavagem dos meus andrajos a uma lavandaria. E como qualquer pessoa deslocada em trabalho estava longe de quem me quer bem, o meu namorado e a minha namorada. A lavandaria ficava (e ainda fica) num bairro muito popular, e é gerido por uma senhora protótipo desse mesmo popular, mistura de bom senso, vontade de tratar bem o cliente mas também de nao deixar um comentário ou uma piada por atirar. Como nao me apetece dizer onde era essa cidade e essa referencia popular, pensem pescadores de Sesimbra, operários da Mouraria (Lisboa), velhotas da Ribeira (do Porto), campinos, ovarinas... No fundo todo um "natural cool" que se está a perder..

Quando era visitada pelos meus dois queridos, costumava pedir que me fossem levantar á roupa á lavandaria, porque esta costumava fechar muito cedo. Repetiu-se muitas vezes que as minhas roupas fossem deixadas por mim de manha e levantadas por cada um deles no dia seguinte á tarde. Um dia, a minha namorada é brindada com o seguinte comentário "Ai, quer as roupas da menina X? muito bem, imagine que eu até sei onde elas estao... Imagine que já distingo quando ela tem o namorado ou a namorada cá só pela roupa que ela deixa".

Pensei se haveria de mudar de lavandaria com medo de enfrentar o tigre, mas deixei me de merdas. Mas fiquei impressionada com a maneira como a minha vida foi posta a nu, eu que achava que era tao discreta.

1.23.2007

Londres, Polyday



(obrigada á PV pela tip)

O ano passado realisou-se em Londres o PolyDay. Contou com cerca de 200 pessoas, e foi uma festa conjugada com discussoes e a adequada incipiente mas consistente visibilidade com efeitos políticos e de empowerment. Mais detalhes no polylivejournal. Para subscrever a mailing list e receber as últimas informacoes sobre o próximo PolyDay, escrever para: announce@polyday.org.uk

1.05.2007

A necessidade de (nao) escolher, parte I



Este post comecou por ser um email muito pessoal mas tanto eu como a recipiente achamos que valia a pena publicar, pois pode ter interesse para mais gente. Nao é somente sobre poliamor ou identidade sexual/emocional. É a minha história e talvez a historia de mais gente.

Vou comecar por falar "daquilo como nascemos" para acabar a falar do modo "como nos veem".


A mononormatividade magoa-me de todas as maneiras.. Quando me classificam em qualquer categoria, mesmo uma que eu nao considere ofensiva. Porque vao comecar a tirar ilacoes e extrapolacoes. Isto é valido para tudo, desde dizer que sou vegetariana, até o queer, passando por ser portuguesa no estrangeiro. As tais ilacoes teem o aspecto de frases do genero "os vegetarianos sao assim e assado, e as lésbicas sao frito e cozido..." Em condicoes de laboratório, ou seja, se me largassem no "mundo" sem ligacoes ao passado ou ao meu presente que se tornou querido á forca de pulso, eu seria, salvo erro, lésbica no sentido literal da palavra. Nao ligo a homens fora da amizade ou de discussoes "tecnicas" sobre tópicos que eu gosto (geralmente música e outras geekices), nao que me obrigue, mas simplesmente porque tem acontecido assim. Apaixono me por mulheres, e nem vou referir a parte da queca, porque acho que a parte sexual nao define a chamada "orientacao sexual" (designacao infeliz de quem acha que o sexo define a existencia ou a saúde de uma relaccao). Fala aqui uma pessoa que esteve junta vários anos com uma pessoa que nao gosta de sexo.

Na prática, nao estou em condicoes de laboratorio. Ha um gajo na minha vida que conheco de ginjeira. Conheco tao bem que me esqueco se é gajo ou que lingua fala. Nao é importante, e quem nao gosta que meta rolhas. Quando entrei nos activismos lgbt, ou na incipiente cena social lésbica portuguesa, há uma dezena de anos, senti que tinha sempre de me esconder ou na melhor das hipoteses, de me justificar. Ultimamente isso mudou, a cena está mais fixe, mais solta, com menos problemas de identidade e menos fascismo ideologico. Noutras palavras, mais autoconfiante. Há quinze anos, eram os anos áureos do separatismo lésbico e do "nao gasto energia com mulheres que a transmitem a homens". A atingir a minha paz interior, apesar desta hostilidade vivida no meu passado na cena portuguesa ajudaram: as poucas cenas estrangeiras em que vivi, muito bi friendly (embora eu nao me defina como bi... Talvez cis-lesbica ;-) ? ) e muito "porosa" (as festas sao explicitamente trans-friendly, muitas vezes tb hetero friendly, um certo sentido de missao politica e ao mesmo tempo de "fun"), e a minha actual namorada, que nao se definindo como poly, e se definindo como polit-lesbian encoraja me no que é um estilo de vida poly e bi, desde o primeiro dia dos dois anos que estamos juntas.

Ha muita poli-hostilidade oficial e oficiosa na cena GLBT, por receio que isso comprometa as discussoes e negociacoes á volta do casamento gay etc. mas por toda a base historica no movimento gay acerca de quebrar tabus e romper com codigos de conduta bacocos, espero uma maior tendencia para haver modos de vida poli ou poli-simpatizantes na cena glbt do que fora.

Vamos ver como as coisas se desenvolvem.

Em resumo, nao sei aquilo que sou, e seja o que for, nao sei se me tornei ou nasci. Mas acreditei durante muito tempo (demasiado) que era hetero e que era monogamica. E tambem acreditei durante muito tempo (demasiado) que tinha a obrigacao de "escolher": ser monogâmica e ser uma lésbica bem comportada ou voltar rastejando para o mundo heterosexual.

12.22.2006

Sugestao de Natal: Else-Marie and her seven daddies


Para quem acha que um estilo de vida poliamoroso é algo que se deve levar ás escondidas e de preferencia que as criancas nao fiquem a saber, é melhor parar de ler AQUI e JÁ.

Para os outros, fica esta sugestao deliciosa de um livro para criancas com temática poliamorosa: Else-Marie and her seven daddies. Aproveitem o natal para oferecer alguma coisa finalmente inteligente a alguém. Este livro por exemplo.

Else Marie tem sete pais em vez de um. E quando descobre que eles a vao buscar á escola, apercebe se de repente de que a sua vida, que até entao lhe parecia tao normal, nao é como a dos outros meninos.

Lindo. Era isto que eu estava a precisar de ter (empowerment) antes de enfrentar o Natal.

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12.19.2006

Quotideano Delirante II


Mais quotideano delirante.

Se é para continuar a continuar a contar a história da minha vida, ou pelo menos a polihistória da minha vida, talvez seja precisa uma pequena introducao.

Nao esperem encontrar aqui descricoes de grandes borgas e sexo escaldante. Isto é um blog sobre poliamor e nem sempre isto tem implicacoes a nivel de libertinagem ou sexo. Por isso, quem quer ler tais descricoes é melhor ir para outra freguesia. Nao quer dizer que nunca me tenha acontecido alguma história bastante rocambolesca, daquelas em que uma pessoa se esconde dentro do armário ou no parapeito da janela. Mas nao é essa a ideia deste blog. A ideia é desdramatisar o conceito de poliamor. Somos normais, sabiam? Ou tao normais ou anormais como os nao poliamorosos.

Sou uma mulher. Identifco me como uma lésbica - bi. Quem me quiser chatear acerca desta aparente contradicao, pode escrever directamente para dev/null, essa grande caixa postal. Idem para todas as tentativas de categorisacao e maintreamisacao, principalmente em questoes de género. Bi e hetero definem uma prefêrencia sexual. Lésbica define um perfil social e político. Sou adulta. Maior. Vivo uma relacao em V. Um V fechado, que nao está aberto a novas pessoas. Um homem, uma mulher. Já vivi um triângulo. Nao resultou. Foi uma história que durou 3 anos e que evoluiu para uma situacao diferente por razoes "naturais", ou seja, por razoes alheias a ser uma relacao "nao convencional", nao monogâmica.

Todas as historias de "quotideano delirante" que eu escrever aqui serao garantidamente verdadeiras, nao imaginadas e especificas á minha vida numa relacao nao monogâmica.

Espero que essas histórias tenham interesse para outras pessoas, quer sejam poliamorosos ou nao. E obrigada por lerem.


(curtam uma personagem poly: Amelia Earhart
http://news.nationalgeographic.com/news/2001/05/images/0828_wireamelia1.jpg)

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12.08.2006

Quotideano delirante, I


Ando sem assunto, e sem tempo para desenvolver as ideias que tenho no meu bloco de rascunhos para este blog.
Mas seguindo a sugestão da L (http://fishspeaker.blogspot.com), vou deixar cair algumas historias de faca e alguidar do meu quotidiano como pessoa poliamorosa, como pessoa que é poliamorosa de uma maneira relativamente assumida para o mundo exterior (e histerior).


Já todos nós fomos ao hospital, uma vez ou outra. E já todos nós tivemos que deixar acompanhantes á porta, ou só levar uma pessoa, o tal quase ignominioso "familiar próximo", parábola para maridos e mulheres..

Tive recentemente um grande susto (uma visita aconchegante da Cordylobia anthropophaga), e tive a sorte de ser duplamente acompanhada. Tive o privilégio de ter duplo acompanhamento, de saber que quando estive a ser operada que ninguém estava só, a sofrer por minha causa, na sala de espera. Tive o privilégio de os médicos não levantarem muitas ondas quando os consultórios ficaram mais cheios do que o habitual (grandes risotas naqueles consultórios, quando a dita Cordylobia anthropophaga se deixava ver). Após 5 médicos (um dos quais fugiu do consultório aos berros quando percebeu o que tinha em mãos) e uma pequena cirurgia, a recordação que tenho deste dia é uma jantarada bem disposta e bem regada ao fim do dia, e momentos de apreensão mas tranquilos e cheios de amor.

Gosto muito da minha vida a três.

(Daqui a uns tempos recontarei esta historia na sua enorme vertente cómica. Referencia: Cordylobia anthropophaga)

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9.27.2006

Sexo em Público, parte I


As reacções aos meus poly outings tem sido variadas mas raras vezes apanhei reacções realmente negativas, daquelas de confrontação directa a raiar o insulto. Estas são geralmente em contexto "internet anónimo", por exemplo em fóruns ou listas de discussão, em que as pessoas podem permitir se tais ataques sem terem de defender a sua posição de modo consistente. Quando o faço, em situações de cara a cara, as reacções negativas são do género condescendência, um olhar de duvida, um esgar de troca. Cepticismo. Por vezes inveja. Porquê?

As pessoas falam constantemente sobre amor, emoções, sexo, mas sempre por detrás duma barricada protectora, seja ela uma "conversa de pendor cientifico" com poucos exemplos na primeira pessoa, ou uma conversa pessoal, mas sempre superficial. Raras vezes se fala com verdadeira frontalidade. Daí, quando tenho os meus poly outings, com as tais pessoas com as reacções menos positivas, tenho a sensação que estou a praticar sexo em publico. Que isso desencadeia uma serie de imagens na mente do ouvinte céptico.

Gore Vidal disse que "Sexo é Politica". Eu digo mais, tudo o que fazemos na nossa vida e que é visível para outrem é politico. Neste caso, a partir do momento que se sai da gaveta romântica de relações a dois, todas as suposições são possíveis.

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6.21.2006

graswurzel

"Atrás de cada rosto insuspeito uma vida única. E á sua frente, um futuro único"

Extracto modificado de artigo publicado na Zona Livre.

Entreguei no último número da zona livre a tradução de um artigo pessoal e descritivo (da minha amiga e cúmplice de conspiração G. Altenhoeffer) sobre poliamor, esperando começar a discussão sobre o tema. Por algumas respostas que tive (obrigada!) senti-me na necessidade de explicar alguns pontos. Não quis apresentar definições ou grandes dissertações sobre o poliamor, não-mogamia responsável, relações abertas, aneis, redes, triângulos, etc. etc. etc.. Basta apresentar o poliamor como qualquer relação que se afasta conscientemente do modelo monogâmico, e já temos material que baste. Não quis fazer uma apologia do poliamor como um modo de vida que todas devamos abraçar imediatamente e sem excepção. Cada uma sabe de si e o amor (em todas as suas formas) sabe de todas. Quis sim, como disse, em primeiro lugar, lançar a discussão. Em segundo lugar, quis mostrar que há ainda mais diversidade do que se vê em primeira aproximação, mostrar que há outros modos de vida a acontecer mesmo ao nosso lado, e que pedem e merecem visibilidade e respeito. Por fim, quis mostrar ás que, mergulhadas numa sociedade que força o paradigma monogâmico, e vivem ou contemplam viver em poliamor, que não estão tão isoladas como isso: "Nós andamos aí".

As reacções que tenho tido têem sido semelhantes em quantidade e qualidade a reacções ouvidas nos últimos anos noutros ambientes, noutros contextos. Vejo isto como animador, pois parece indicar que diferentes ambientes sociais não influenciam a predominância de um certo tipo de reacção. Estamos pois a falar de um tema que é essencialmente humano e pessoal e que não é influenciado por modas, idade, culturas ou educação. Tive reacções de grande hostilidade (a raiar o insulto), outras de grande cepticismo ("esse modo de vida é sustentável?"). Tive outras de tolerância em que pessoas que não se imaginavam fora do modelo monogâmico aceitavam que isso pudesse ser válido e respeitável para outrem. Dentro deste grupo ouvi muitas referências a uma ou outra história poliamorosa de pessoas delas conhecidas. Finalmente conheci algumas pessoas que se identificavam (em teoria ou em prática) com alguma forma de poliamor.

As tais reacções de hostilidade foram as que me fizeram desenterrar o que vem a seguir. Nas comunidades GLBT de língua alemã, a fracção lésbica que recusa o paradigma monogâmico tomaram como designação para esse movimento a palavra "Schlampagne", que é uma mistura bastante feliz de "Campagne" (campanha, no sentido de luta política) e "Schlampe" (vádia, galdéria, pêga). Do mesmo modo que no início dos movimentos feministas e lésbicos a palavra "lésbica" era usada como insulto pelo vulgo, sendo adoptada pelo movimento, reinventada com um novo sentido positivo, houve mulheres que começaram a usar palavras como "vadia" ou "galdéria" para se autodescreverem como mulheres rebeldes em relações não monogâmicas, fora da boa ordem estabelecida, que não se preocupam minimamente com a reprovação de quem usa tais palavras como insulto intencional. Pergunto-me muitas vezes qual vai ser a palavra portuguesa (existente ou por inventar) que vamos inevitavelmente descobrir para descrever a mesma identidade.

A "Schlampagne" bate-se pela colocação ao mesmo nível de consideração (material e social) de todos os modos de vida, em contrário ao acumular de privilégios (materiais e sociais) de certas formas de relação aprovadas socialmente (estamos a falar de casamento em sentido lato, em todas as suas variantes gay-hetero-religioso-civil-etc). As mulheres dinamisadoras deste projecto têem organisado encontros regulares. Na ordem dos trabalhos destes encontros encontra se a elaboração de estratégias concretas para atingir esse fim. Mas estes encontros têem servido também para três outros objectivos muito importantes. O primeiro é a autoajuda (criação de redes de contactos, encontros, troca de esperiências, descoberta de identidade), o segundo a divulgação (quer dentro das várias comunidades lésbicas quer para a comunidade em geral) e o terceiro a influência política através de colaboração e negociação com organisações de solidariedade.

A modo de conclusão, gostava de acrescentar que não aprecio cega e necessariamente tudo o que se faz "lá fora" a nível de activismo ou auto identificação GLBT. A nossa comunidade é pequena, e por ter pouca gente activa, desenvolve-se mais devagar do que as comunidades "lá fora", é um facto. Mas há muitas vezes a tentação de tomar o estado das coisas (ou pelo menos a face mais visível desse estado de coisas) "lá fora" como a bitola do que as coisas devem ser ou passar a ser nas comunidades GLBT portuguesas. Penso que precisamente por não termos o mesmo ritmo de acontecimentos que "lá fora" temos a oportunidade de evitar repetir os erros de outros e de encontrar uma identidade própria. Isto para explicar que fui buscar este exemplo alemão simplesmente porque o tema me diz pessoalmente muito respeito, porque ilustra os conceitos que tenho estado a tentar explicar, porque é uma faceta do movimento GLBT de "lá fora" que, curiosamente, é pouco conhecido cá, e porque tem muito potencial em termos de discussões instrutivas.

Em Portugal, não sei se queremos ou se alguma vez poderemos atingir tal dimensão e nível de organisação. Esbarramos com os habituais argumentos da massa crítica e a falta de tradição associativa portuguesa. Mas parece haver motivos para se dizer que há bastantes mulheres/lésbicas que vivem ou contemplam viver "de modo contrário á ordem estabelecida". Resta saber se essas mulheres têem interesse em criar as tais redes de contacto e ajuda.


Fontes:
[1] www.graswurzel.net/243/schlampagne.shtml
[2] www.wikipedia.org (poliamor/polyamory)
[3] "Breaking the barriers to desire", K. Lano and C. Parry (ed.).Five Leaves Publications

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5.24.2006

A perfect day

Escrevi este texto em Janeiro de 2005, no mesmo dia deste acontecimentos aqui descritos. Recentemente a vossa já conhecida Gwendo resolveu compilar uma zine poly em Munique, a Krake, e pediu me alguns textos. Desenterrei este que traduzi e adaptei para inglês. Quem tiver interesse em receber a Krake, que é escrita em alemão com excepção dos meus textos e se dirige a um público feminino (queer) deve contactar-me ou á Gwendo.


6/Jan/2004 - "A perfect day", or, "on the nature of Present and Future in relationships".

We had a beatiful day today, cold and bright, planted in the middle of a grey and condescending January. We decided to jump in the car, throw some wine and cheese inside a picnic basket and just drive to that medieval village we contemplated visiting for so long. In pure honesty, what was really important was not quite the village itself, but driving there, and images like that of a k7 box tapping lazily against a thermobotle filled with tea on the bottom of the car.

The day was so bright that we drove with an open car, heater constantly busy. Nothing between us and the blue sky except icy wind. Buried in berets, caps and coats, we insisted in the decadent poetry of the open car. We crossed the kms of suburbia where nobody who wants to be taken seriously really wants to live. We suffered with a smile and dreamy eyes all the fatal colds and lung infections that the bypassers would predict (or even wish) us.
The rolling hills immediately afterwards were crossed at antisocial cruising speed, more adequate for contemplative beings than for drivers in a competitive world, "Durutti Column"´s gentle music as soundtrack. All other cars on the road got, thankfully, impatient and eventually overtook us, finally leaving us alone on the asfalt, mountains looming proud on the horizon as sentinels. Being January, the shadows were dark and long against that impossibly bright green. We were very happy, happy inside, and happy with us. All of us. Very likely we were asking ourselves in silence (well, I was, at least, definetely) if we shouldn't be together again, specially after we recreated such a beautiful moment without any effort. But nobody voiced it loud. Maybe because all of us knew that this thought was not only in one´s head. Maybe because we were in a way together again.

We got to our destination, and unanimously decided to skip the cultural visit, expontaneous empty heads we all are, and just indulge into walking along the river where so many before us strided through the centuries. Let's assume it, is has been a quite "bourjoise" saturday, and not even shopping was overlooked, in an improvised antique shop contiguous to the city walls, smelling of mold and "saudade". This shop we left with the already usual amount of odd music reliqs and unlikely objects which will end up some day in another antique shop after we become dust, without lips to kiss and love anymore.

But, allas! Suddenly the fight erupted, violent, unsummoned, redundant and ridiculous like always. It is the end of the state of grace, the World becomes ugly in a second, and each of us only wants to go back home, to familiar territory, where one can be alone and not face this another defeat. We know then, that this fighting is an old story and that rivers don't run backwards.

Now it is clear why we are not together anymore. Because of never being able to handle such fights. But at the same time, we are silently certain that such moments tell us clearly how precious the Present is, and that they remove all fear from the Future. If this is our beautiful and bitter Present and we have no expectations from the Future, then we are free because we have nothing to loose. Ours is the complete beauty of a moment because we don't try to confine it.

We flee to the car, because only a trip back home can give us the isolation needed. After such bitter discussion none of us can endure to sit together. But suddenly we hear music, and we follow it, like children. There is a party going on. We are explained that is a very seldom heppening, takes place only every seven years for centuries and that people drive specially for the occasion (and we land on it unknowing.. so typical) We drink some with the crowd, and let the party creep inside us. We are still bleeding inside, but now we are somehow in peace. We go to the car. We lay a table cloth over the motor cover, blue and white squares over metal, and make our picnic there, in the cold air. The crowd and the dance are a distant rumour now.

Now we are home. I am writting this. We pacified our feelings over a spartan but correct table. The same blue and white table cloth, some beans, bread, wine, some manioc as dessert. Coffee, "medronho" and a hand rolled cigarrette to close it. I spent the whole trip home cunning ways to ensure I could be alone, not see these two lovely but so irritating darlings for some time. Too painful to see them. But as soon as we arrived, it was just automatic to sit at the table and eat together, like we did for years, like a family that we never stopped being, even after we are not together anymore. I watch them talking on the sofa as I writte this. They know what I am writting about.
I am almost finished with the writting. I think I will publish it online, and then go over there, to the sofa, rejoin those two, rejoin our bliss. I don't know what the evening is reserving me, but I am sure it will be wonderful, after a wonderful day. Maybe this evening has no Present and no Future, or maybe it has. But this is not important. Love doesn't care about the potential of a nice and confortable Future. Love is something that just happens and knows no boundaries.