Os meio LGBT alegram-se em maior ou menor grau. Afinal, Portugal está renitente em seguir a tendência que a Europa se prepara com maior ou menor inercia para ir paulatinamente adoptando, mas será uma questão de tempo. O argumento na ordem do dia é o da abolição de um tipo de discriminação, que impede alguns cidadãos de terem acesso a uma instituição que outros têm.
Embora eu fique parcialmente contente por a coisa provavelmente ir para a frente, ficarei sempre com uma pedra no sapato. Suportarei o alargamento do casamento por uma questão pragmática, porque basicamente "se heteros podem, nós também temos de ter". Abrirei uma garrafa de champanhe e acho que é um tijolo importante, demonstrador de uma emancipação da sociedade de portuguesa que todos devíamos saudar.
Mas na verdade o que eu queria era que a figura casamento, hetero, homo, religioso e civil desaparecesse da face da Terra, ou pelo menos das sociedades que têm a mania de insistir em se chamar democráticas e igualitárias.
Vamos a ver..
Eu, antidote, mulher, adulta, solteira, trabalhadora, vulgar de Lineu..
Se eu fundar uma comuna, ou um apartamento com amigos para poupar dinheiro, não vou ter os mesmos incentivos fiscais e "apoios à família" do que um casal "casado" ou em união de facto.
Porque é que eu, como figura fiscal/legal "mulher solteira" tenho de estar mais fragilizada perante a sociedade do alguém que esteja casado com aquela teia de protecção legal toda à volta deles?
É realmente minha escolha ser solteira ou permanecer solteira (são na verdade duas coisas diferentes), mas perturba-me o assegurar de privilégios, que estão a ser confundidos com direitos,que outros tenham, sejam heteros ou não.
Mais ainda me perturba mais que o Estado reconheça apenas essa forma de emocionalidade como válida. Porque é que eu não posso passar procurações médicas a amigos escolhidos a dedo (ou seja, se eu ficar em coma, porque é que são os meus pais a decidir "desligar a máquina" em vez de ser quem eu quero)? porque é que as minhas disposições testamentarias são passadas a ferro no caso de eu ser solteira (se eu morrer os meus pais herdam sempre uma parte independentemente do que está no meu testamento), e um bocadinho mais levadas a sério se eu estiver casada?
Porque é que uma criança só pode ser adoptada por um casal? o que é que há de menos respeitável/ético em pessoas não casadas ou mesmo pessoas sós?
Perturba me ainda mais que não perturbe mais gente ainda, que o Estado esteja a dizer com isto, com a figura do casamento, que todas as outras formas de estar são toleradas, mas não são a certa. e isso incluindo ser solteiro, viúvo, já nem falo de comunas, engenharia social ou famílias estendidas, com relações não monogâmicas ou não... Isso chama-se MONO-NORMATIVIDADE, e trocando por miúdos, é a capacidade das instituições passarem a ferro tudo o que não é considerado normal/mainstream/desejado.
Reconheço sem dúvida nem hesitação o impulso que leva pares que se gostam a casar. E enquanto a lei, a instituição casamento existir, e for assim, ficarei contente por eles e irei festejar com eles em toda a sinceridade. Ficarei, quase em contradição comigo, contente quando os primeiros casais do mesmo género se casarem em Portugal, porque indicará um avanço das mentalidades, e porque os nubentes estarão mais feliz nesse dia do que noutros.
Mas o casamento é um atentado ás liberdades individuais porque nos diz que um individuo só, um cidadão, não é suficiente como entidade e que precisa de se comportar de uma certa maneira para ser completo e útil à sociedade.
Sendo assim sou e serei politicamente sempre e constantemente contra a figura do casamento, por não ter cabidela numa sociedade que se quer igualitária e democrática.
Obrigada por lerem.
Vejam um óptimo artigo sobre o tema, via panteras rosa, aqui:
http://panterasrosa.blogspot.com/2008/09/igualdade-no-acesso-ao-casamento-civil.html
e a telenovela política vai por aqui:
http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1343486&idCanal=23
.
ó catraia (felizmente) o panorama nacional não está assim tão mau como o pintas.
ReplyDeletetu como mulher solteira, e como já tens mais de 25 anos (não te estou a chamar velha, fofa!) podes ficar na lista de adopção (ou adoção, segundo o tratado - brasileiro - da ortografia). o problema está na lista ENORME de espera, muito maior que a do nosso sistema de saúde (como é possível?!) adiante...
quanto ao testamento, hoje em dia se viveres há 3 anos com alguém, como casal, e existam testemunhas são te dados uma serie de direitos (e ao/à teu/tua conjuge) aquando a morte ou para efeitos fiscais.
quanto aos hospitais, já há uns anos que não faço qualquer trabalho nessa área logo não vou falar. (mas prometo futura opinação sobre o assunto)
Importate: post bonito oxalá que sirva para acordar as pessoas assim a tempo de meterem a tv sintonizada, dia 10 de Outubro(isto porque nem todos vivem a 2 passos do Parlamento!).
ass: HabitosMaus
Obigada :-)
ReplyDeletemas e se tiveres mais que um conjuge, ou nao quiseres nomear um como conjuge para nao o por "acima" dos outros? trocando por miudos.. eu podia casar... mas se eu o fizesse, estava a por uma das minhas "pessoas importantes" acima das outras e eu nao quero isso...
ou muitas vezes vives com alguem mas se calhar preferes que seja outra pessoa a tomar as decisoes importantes.. ja tuve uma namorada que amei perdidamente, mas a quem eu nunca daria decisoes real life para tomar...
enfim!
Na sociedade ideal, cada pessoa deveria ter a liberdade de viver com quem quer e da forma que quer, deveria ter a liberdade de optar pelo casamento ou não (sem ser recriminado), de adoptar uma criança, independemente de se tratar de um casal ou de um indivíduo sozinho. Ideal também seria que as instituições respeitassem e aceitassem todas estas possibilidades, e outras que surjam. Porém, esta "sociedade ideal" implica uma evolução das mentalidades que não acontece de um dia para o outro. Ainda há um longo caminho a percorrer, mas penso que já estivemos mais longe...
ReplyDeleteA questão abordada no teu post é bastante pertinente, pois a sociedade assenta num modelo de relações que está completamente desajustado da realidade actual.
ReplyDeleteO desenvolvimento científico-tecnológico, que se reflectiu na super-estrutura, alterou completamente a forma de estar em sociedade, por isso, certos valores tradicionalmente aceites, como o casamento e a família, estão a ser amplamente questionados.
De facto não faz sentido reduzir-se a afectividade ao namoro e ao casamento, pois há muitas formas de vivermos os nossos afectos sem ser por meio da exclusividade duma relação.
É necessário agitar-se as massas, pois estão alienadas pelos valores heterossexistas e heteronormativos do casamento e afins, cujo estado de coisas é potenciado pelo capitalismo.
Hoje em dia o casamento é uma instituição social anacrónica, não passando dum mero contrato económico e social.
Acredito que à medida que for havendo pressão dos sectores progressistas da sociedade civil, o obscurantismo potenciado pela Religião e pela Moral judaico-cristã enfraquecerá, dando lugar a uma sociedade livre a aberta.
Conheço alguns homens gays e mulheres lésbicas que não tendo relação ou não assumindo a sua relação conseguirão adoptar.Heterossexuais na pessoa singular tb.conheço que conseguiram adoptar.Os critérios da lei,e de quem a aplica de facto não os conheço.Sei que legalmente é vedado o aceso à adopção assim como à inseminação artificial por parte de pessoas gays e lésbicas.Gostava muito de saber como é que em termos de lei se cria estas exepções.
ReplyDeleteViva.
ReplyDeleteExcelente post.
Acima de tudo gostei da abordagem pela base, ou seja, sobre a necessidade ou desnecessidade de contractos sociais que não retiram direitos aos indivíduos, mas o dão a quem os seguir, ou seja, o factor interessante aqui é que não existe uma desigualdade contínua, apenas a possibilidade de anomia em grupos e pessoas que não se vergam às imposições ou tão somente tão imposições estão muito fora do seus ambitos pessoais. Mesmo que por casamento se tente uma alusão artística, cultural, religiosa, ou outra coisa qualquer, a única legal é a cristã. Casamentos celtas não contam para as "legalidades civis" a exemplo, e quem sabe uma pessoa podia casar-se consigo própria, pelo menos a liberdade pessoal estaria assegurada mesmo com a imposiçao desse contracto. Freiras casam-se sozinhas, espectro muito interessante na liberdade que se tem quando se seguem as imposições religiosas, políticas e económicas da sociedade.
Interessante na sequência do post é observar que o casamento, com todas as suas regalias para quem o aceita e as suas ausências para quem o descarta poderia muito bem ser considerado inconstitucional pela base, sem andar com telenovelas aborrecidas e de malucos no meio da ponte com o seguinte artigo:
"Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual."
As leis que parasitam as coisas mais basilares transformam os debates e supostas resoluções em avalanches de dogmas e demagogias alimentados pela estupidez e mediatismo que embala a sociedade no conformismo e na alienação.
Cumprimentos,
BM Resende