9.17.2012

Fitas: sex-positive

Fitas sex-positive, by Ann Antidote e Daniel Cardoso.
Um artigo escrito a pensar em publicacao integral, acerca de filmes DIY, guerrilla film making, festivais de cinema depravados, e outras coisas. 

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A ideia por detrás de se ser sex positive não é a de se converter todo o mundo num imenso bacanal em que pacatos cidadãos se magoem com risco de vida (e da dignidade) ao escorregar no lubrificante. Tal como o ativismo LGBT não pretende converter o globo numa legião tebana. A ideia - infelizmente pouco ventilada - por trás de uma postura sex positive, entre outras, é que todos os modos de vida conscientes e consensuais merecem respeito. Já dizia a avó: "não tenho nada a ver com o que as pessoas fazem umas com as outras lá na casa delas". E é assim mesmo.

Muitos perguntam o porquê de ser agora, este crescimento do sex positive, da pós-pornografia, da pornografia feminista - de todos estes temas que, antes, nem atrás de portas se sussurravam. Há várias razões, mas uma delas é muito simples: uma série de coisas deixaram de ser proibidas. Há uns anos ainda se podia ir para a cadeia por foder com a pessoa do género errado, ou no sítio errado, ou simplesmente por mostrar demasiado exuberantemente uma identidade ou uma preferência. Coisas como a homossexualidade ou o BDSM foram até há relativamente pouco tempo (ou ainda não deixaram de ser, em países mesmo aqui perto) fortemente criminalizados e penalizados (apesar de reconhecermos que estão ainda em voga práticas mais subtis e indirectas de criminalização e penalização).

Claro que o crescimento da internet, e a possibilidade de cada pessoa escolher, até certo ponto, com que produtos culturais desejam interagir, em vez de ficarem sujeitos aos distribuidores de cinema da cidade onde vivem, mudou hábitos e criou circuitos alternativos de criação e distribuição de filmes. Por sua vez, esta mudança de hábitos criou espaços e mentalidades recetivas a produções DIY (faça-você-mesmo) e sem orçamentos que tornam o fazer de filmes (e a sua distribuição e reprodução) acessíveis a qualquer pessoa com um computador e uma câmara básica (tendência essa que, de resto, teve a sua pré-história com a tecnologia VHS e as câmaras pessoais).

Com isto explodiram nos últimos anos os ciclos de cinema especializados, e também os ciclos de cinema de temática sex positive e/ou sexualidades identidades não normativas. Temos em Berlim o PFF (Porn Film Festival), temos o TranScreen em Amesterdão (ainda a aceitar submissões!), temos o Fetisch Film Festival (FFF) em Kiel, temos o San Francisco Trans Film Festival, o Sex Worker Film Fest em Hamburgo, os Feminist Porn Awards no Canadá ou mesmo o Sydney Underground Film Festival na Austrália - só para citar uns quantos.

Passa-nos ao lado? Não: os mesmos mecanismos que mudaram a criação e distribuição de filmes, tornaram todo este circuito uma pequena aldeia global. Berlim e Amesterdão estão ali mesmo ao lado, Kiel ao virar da esquina, a Austrália um pouco mais longe... E se essas distâncias podem criar uma sensação de deslocamento para quem não está a viver nos sítios em questão, a mediação tecnológica vem dar a certeza que não é preciso "ir para fora", para se conseguir fazer bom trabalho e ser-se reconhecido por isso.

Tudo isto para dizer que também há a presença de pessoas portuguesas nos festivais estrangeiros, em várias categorias. Nós próprixs estaremos lá. A Ann Antidote tem um workshop no PFF de Berlim - onde Daniel Cardoso vai ter a estreia mundial da sua curta "Herm::aphrodite" e que arranca no fim de Outubro - e vai ver duas curtas suas serem exibidas no FFF de Kiel: "Vacations in SlutMeadow" e "Remember Gay Love Story", já este mês.

Sabem o que faz lá falta, porém? É que vocês, leitoras e leitores, peguem nas máquinas fotográficas, de filmar, nas webcams, nos brinquedos sexuais, nas amigas e amigos (e/ou em vocês mesmas e mesmos) e arrisquem, experimentem, façam. Mostrem ao mundo que somos diversas pessoas a viver num mundo diverso.

Daniel Cardoso – http://danielscardoso.net/